Os 50 melhores álbuns de 2021
Para muitos, 2021 foi mais um ano repleto de incerteza. Isso também se refletiu no mundo da música, com o setor da cultura a tentar navegar num mar cheio de dúvidas, quer seja em relação a concertos e festivais, ou a lançamentos de música. Ainda assim, nos últimos 12 meses, foram muitos os artistas e bandas que escolheram este ano para apresentar trabalhos novos. Os 50 álbuns que integram esta lista são diversos, mas todos merecem o respetivo destaque. Entre caras novas e figuras de renome, o que não faltou, felizmente, em 2021 foi música. O Rui Cunha é o novo melómano que temos neste projeto. De álbuns lançados este ano, ouviu 137 álbuns e aqui vos deixa a lista dos que considera os melhores, argumentando eximiamente porquê.
50. Tinashe – 333
Com alguns êxitos já lançados, o maior enigma em torno de Tinashe resulta do facto de ainda não ter atingido um maior nível de popularidade. Se “333” ditará essa mudança, o tempo dirá, mas no que toca à qualidade da música em si, ”333″ é a melhor exibição de Tinashe até ao momento, com uma coleção de faixas R&B bastante eclética e bem produzida (quando em comparação com a maioria dos álbuns de R&B mais populares dos últimos tempos) e uma quantidade substancial de músicas intoxicantes.
49. Snoh Aalegra – TEMPORARY HIGHS IN THE VIOLET SKIES
Após vários anos na indústria, Snoh Aalegra finalmente tem um álbum em seu nome que quebra a imagem de ser apenas uma artista feita para colaborações. “TEMPORARY HIGHS IN THE VIOLET SKIES” revela-se com o seu decorrer como Snoh na sua versão mais variada e vocalmente expressiva. Com a ajuda de nomes reconhecíveis como Tyler, The Creator, The Neptunes, No I.D. ou James Fauntleroy, a maioria das faixas dão, justamente, mostras do seu talento.
48. slowthai – TYRON
Dividido em duas partes (representando os dois lados de Tyron enquanto pessoa), o segundo álbum de slowthai analisa de forma meticulosa o rapper enquanto pessoa e enquanto celebridade. O primeiro disco tem algum caráter, arrogância e batidas pesadas, mas é a segunda metade de “TYRON” que sai por cima, dando destaque a um lado mais íntimo até então inexplorado de slowthai, permitindo o autoquestionamento e o florescimento do mesmo.
47. Cassandra Jenkins – An Overview on Phenomenal Nature
“An Overview on Phenomenal Nature” pode ser curto para defeito do mesmo, com apenas 7 canções e 31 minutos, e a primeira metade do álbum, em termos de qualidade, está a léguas do seu final, mas, enquanto dura, é um agradável companheiro meditativo, um diário íntimo, uma tranquila viagem pela mente de Cassandra e pela própria natureza.
46. Wiki – Half God
Com Navy Blue a cuidar por inteiro da produção de “Half God”, Wiki consegue encontrar uma parceria perfeita para o seu estilo no rapper californiano. Mesmo que seja o rapper de Nova York que tem que se ajustar às sonoridades lo-fi e granuladas de Sage e dos convidados de peso (MIKE e Earl Sweatshirt, por exemplo), “Half God” é a primeira vez em muito tempo que Wiki se apresenta com uma garra inquestionável.
45. James Blake – Friends That Break Your Heart
Com o seu quinto álbum de estúdio, James Blake completa a sua metamorfose enquanto cantor e compositor. Afastando-se ainda mais das suas raízes eletrónicas, James prefere focar-se na melancolia e na calma, tal como “Assume Form” mostrou nalgumas partes. Infelizmente, é um dos seus projetos mais inconsistentes, mas os singles de “Friends That Break Your Heart” e mais alguns pontos altos dispersos no álbum mostram um James Blake ainda em forma.
44. Maxo Kream – WEIGHT OF THE WORLD
Ao contrário dos seus anteriores lançamentos, “WEIGHT OF THE WORLD” finalmente afirma Maxo Kream como uma voz a ser ouvida no mundo do hip-hop. O mesmo rapper que gerou entusiasmo como um dos talentos mais brilhantes de Houston, há quase uma década, consegue agora renovar e justificar esse entusiasmo com um álbum cheio de coração, orgulho e autossuperação.
43. shame – Drunk Tank Pink
Para os shame, “Drunk Tank Pink” é um avanço em relação a “Songs of Praise”, um segundo álbum menos unidimensional, mesmo que isso sacrifique um pouco da consistência do seu trabalho de estreia. Os destaques de “Drunk Tank Pink” são tão explosivos e vigorosos quanto deveriam ser, acabando por compensar alguns dos momentos menos conseguidos por parte da banda britânica.
42. PinkPantheress – to hell with it
Com apenas 19 minutos de duração, o primeiro projeto do PinkPantheress (sob o formato de “mixtape”) é razão suficiente para justificar a sua rápida ascensão ao estrelato através de plataformas como o TikTok, tudo isto durante o seu primeiro ano a lançar música. Ressuscitando estilos musicais pouco utilizados nos últimos anos, como “drum and bass” e “2-step”, “to hell with it” é provavelmente um primeiro panorama magnético e viciante de uma futura sensação da música pop.
41. Kanye West – Donda
Depois de mais um pré-lançamento turbulento repleto de atrasos, rumores e controvérsias, o décimo álbum de Kanye West é uma confusão de ideias interminável com mais de 90 minutos. Pela primeira vez, Kanye não inova tanto como o habitual, acabando por ficar frequentemente para segundo plano no seu próprio álbum. No entanto, isso não significa que perdeu o seu lugar como uma das lendas vivas do hip-hop, porque, nos seus momentos mais gloriosos, “Donda” consegue ser envolvente e excêntrico. Está longe de ser um dos seus melhores álbuns, mas é, sem dúvida, o álbum que melhor representa a sua “public persona” – para o bem e para o mal.
40. BADBADNOTGOOD – Talk Memory
Desde o seu começo, os BADBADNOTGOOD sempre encontraram, de uma forma ou outra, inspiração no jazz, sendo “Talk Memory” o álbum em que essas influências são mais percetíveis. Com a ajuda de uma lista invejável de convidados, como Arthur Verocai ou Laraaji, o grupo presta uma homenagem satisfatória aos sons do “cosmic jazz” e “spiritual jazz” de nomes como Pharoah Sanders ou Sun Ra, sem sacrificar de todo a sua identidade no processo.
39. King Gizzard & The Lizard Wizard – Butterfly 3000
Para os King Gizzard & The Lizard Wizard, a versatilidade é já um dado adquirido nos seus lançamentos. “Butterfly 3000” não foge à tradição, sendo mais uma escolha de sons inesperada de uma banda que se recusa a estagnar. O synth pop à la King Gizzard é uma nova direção estranhamente bem-vinda que complementa as bases de “psych rock” do grupo. O resultado assemelha-se a uma “jam session” dançável e irresistível que fazem de “Butterfly 3000” um surpreendente ponto alto na carreira da banda.
38. Vince Staples – S/T
O tom discreto do novo álbum de Vince Staples pode ser desapontante para muitos, mas, quando explorado mais a fundo, retêm-se alguns dos seus momentos mais pessoais até agora. Com apenas 22 minutos, Vince e Kenny Beats, que lida exclusivamente com a produção, têm química suficiente para fazer a curta duração do álbum valer a pena. Não vai mudar a opinião de ninguém sobre ele, mas, ainda assim, é uma adição sólida à sua discografia.
37. IDLES – CRAWLER
Com “Ultra Mono”, os IDLES afastaram-se do estilo que conquistou muitos fãs anteriormente. “CRAWLER” é, nesse sentido, um regresso aos sons marcantes de “Brutalism” e “Joy as an Act of Resistance”, com Joe Talbot e companhia a recriarem muitos dos mesmos tons usados nos seus dois primeiros álbuns, embora com menos vigor do que antes. Além disso, “CRAWLER” fica um pouco perdido no seu próprio caos. Ainda assim, este aspeto não afeta muito do que é mais um registo globalmente sólido para a banda.
36. Lana Del Rey – Chemtrails Over The Country Club
Lana Del Rey e Jack Antonoff juntam esforços, mais uma vez, para um conjunto de faixas menos épico, mais estagnado e minimalista, ainda que compartilhe muitos dos elementos principais que fizeram de “NFR” um momento assinalável na carreira da artista. Os pontos altos de “Chemtrails Over The Country Club” são escassos, mas, quando aparecem, são mais do que bem-vindos. Sem dúvida, o mais coeso dos dois discos de Lana Del Rey lançados em 2021.
35. Boldy James & The Alchemist – Bo Jackson
Depois de uma série de projetos incríveis em 2020, Boldy James volta a reunir-se com uma figura enigmática do hip-hop, The Alchemist, para uma sequela a “The Price of Tea in China”. Alchemist define de forma eloquente o tom de “Bo Jackson” com os seus instrumentais luxuosos e intrigantes, mas a melhoria mais notável vem do próprio Boldy James, que se apresenta mais poderoso e confiante do que em colaborações anteriores. Mais um resultado bastante satisfatório para a dupla, provando que a sua química não é irrepetível.
34. Bruno Pernadas – Private Reasons
Desde o lançamento de “Those Who Throw Objects at the Crocodiles Will Be Asked to Retrieve Them”, Bruno Pernadas ganhou um culto impressionante de seguidores, graças ao seu domínio a fundir estilos musicais e a construir melodias cativantes e coloridas baseadas nessa fusão. Cinco anos depois, Bruno e a sua banda oferecem a sua versão exótica de pop psicadélico com “Private Reasons”. É tão variado quanto o resto da sua discografia e não irá dececionar aqueles que já ficaram conquistados pela sua música.
33. Clairo – Sling
“Sling” apresenta Clairo num novo registo. Com claras alusões a artistas como Joni Mitchell e Elliott Smith, o seu segundo álbum foca-se na calma e na ternura. A produção silenciosa e ornamentada de Jack Antonoff torna-se uma desvantagem para a atratividade inicial da maioria das músicas, mas as letras e composições mais aprimoradas de Claire compensam essas deficiências. Os fãs de “Immunity” podem ter alguma dificuldade a reverem-se em “Sling”, mas este seu segundo trabalho é um produto construído e feito para o conforto.
32. Juçara Marçal – Delta Estácio Blues
Da voz ousada de Juçara Marçal ao feroz trabalho de produção focado em “samples” (supostamente inspirado na obra-prima de Danny Brown, “Atrocity Exhibition”), “Delta Estácio Blues” é consistentemente rebelde e excêntrico, com Juçara pronta para a luta, opondo-se por completo ao atual governo brasileiro. É certamente um dos projetos mais peculiares e inventivos saídos do Brasil nos últimos tempos, mesmo que perca um pouco do fôlego inicial nos seus momentos finais.
31. Yola – Stand For Myself
Yola tem vindo a fazer mais pela música country do que a maioria dos seus principais artistas e “Stand for Myself” prova por completo esse ponto. Com um som rico e embelezado, fundindo country e soul, Yola supera “Walk Through Fire” com um álbum cheio de hinos autoafirmativos, tudo feito com delicadeza e uma admirável atenção à produção, fazendo de “Stand For Myself” um álbum fácil de gostar.
30. MIKE – Disco!
“Disco!” é mais um álbum do cofundador do coletivo “sLUms”, marcado, principalmente, pela sua consistência. O seu luto relacionado com o falecimento da mãe ainda está inegavelmente presente em “Disco!”, mesmo que MIKE surja, desta vez, numa faceta mais esperançosa e otimista. Pela primeira vez desde “Tears of Joy” em 2019, parece que a jornada de MIKE rumo à paz e à autodescoberta começa a ficar um pouco mais clara.
29. Snail Mail – Valentine
O segundo trabalho de Lindsey Jordan enquanto Snail Mail é assertivo, curto e doce. No entanto, falta um pouco da potência emocional que definiu o seu álbum de estreia, “Lush”, optando porventura por uma paleta de sons mais próxima do pop que marcou a década de 2000. Esta mudança de ritmo encaixa-se com eficácia na pequena duração de “Valentine” e, de qualquer forma, Lindsey ainda é extremamente cativante a explorar o amor, a fama e a juventude de diferentes ângulos.
28. Arooj Aftab – Vulture Prince
Durante a produção de “Vulture Prince”, Arooj Aftab perdeu o seu irmão e um amigo próximo, algo que inegavelmente marcou as sessões do seu terceiro álbum. O resultado é uma viagem especial, exuberante e meditativa pela sua mente e dor. Algumas músicas foram iniciadas quase há uma década, com outras a serem escritas após esses eventos traumáticos. Enquanto experiência global, a instrumentação exuberante e a voz de Arooj ficam cada vez mais encantadoras à medida que o seu luto progride.
27. Remi Wolf – Juno
“Juno” prova que Remi Wolf veio para ficar com o seu toque novo e interessante de música pop. O álbum orbita de forma genuína entre todas as ideias que lhe surgem, construindo uma coleção colorida e destemida de canções que conseguem refletir todo o carisma que Remi Wolf possui. “Juno” pode ser alegre e engraçado quando a ocasião requer, introspetivo e autoconsciente quando necessário. Uma coisa é garantida: chama a atenção como poucos álbuns de pop deste ano.
26. Genesis Owusu – Smiling With No Teeth
Com “Smiling With No Teeth”, Genesis Owusu oferece uma das mais notáveis surpresas do ano, com um álbum de estreia vitorioso que aponta com precisão em várias frentes. Com o frequente recurso a metáforas e alegorias representativas de um caos mental e global, a fim de amarrar a lista diversificada de 15 faixas, Owusu reflete sobre si mesmo e o mundo em seu redor com muito estilo, humor e atitude.
25. Indigo De Souza – Any Shape You Take
Focando-se maioritariamente nas sonoridades do “grunge-rock”, o segundo álbum de Indigo De Souza, “Any Shape You Take”, é um registo de extremos sentimentais. Assim como “I Love My Mom” de 2018, cada música é retratada como uma página num diário, um lugar para transcrever a dor. Com a mudança para um estilo de gravação menos “DIY” desta vez, a sua capacidade de compor canções honestas e emocionalmente potentes brilha ainda mais do que antes.
24. Mach-Hommy – Pray for Haiti
Mach-Hommy e Westside Gunn deixam finalmente os egos para segundo plano e celebram com o melhor disco vindo da “Griselda” em 2021. As letras ágeis e arrojadas de Mach-Hommy estão em pleno, como de costume, mas o que distingue “Pray for Haiti” dos seus outros lançamentos é a curadoria dos instrumentais feita por Gunn. As “samples” que soam a luxo, as “ad-libs” magnéticas, ao lado da iconografia dos versos de Mach-Hommy, são expectáveis, mas não deixam de formar uma combinação incrível de estilos.
23. Turnstile – GLOW ON
O multifacetado quarto álbum dos Turnstile tem energia suficiente para continuar a fascinar ao longo de 35 minutos. Uma vasta quantidade de estilos são implementados nas 15 faixas de “GLOW ON”, com cada mistura de géneros a funcionar de formas arrojadas, em grande harmonia com as suas letras contagiantes. Um dos discos de “hardcore” mais vanguardistas dos últimos anos.
22. L’Rain – Fatigue
“Fatigue” funciona menos como um típico e acessível álbum de R&B e mais como uma “sound collage” repleta de jazz, “psychedelia” e, sobretudo, abstração. Loops e sintetizadores facilmente se entrelaçam com guitarras, saxofones, entre outros, com a voz celestial de Taja Cheek a ser fulcral para criar uma breve e serena apresentação de como o neo-soul pode soar num estado mais sereno e sem leis.
21. Dry Cleaning – New Long Leg
A surpreendentemente carismática voz de Florence Shaw regula o tom de “New Long Leg” e da abordagem dos Dry Cleaning às habituais convenções de “post-punk”. Mesmo que um pouco restringido pelo próprio som que define a banda, o primeiro álbum do grupo aproveita os melhores elementos dos seus EP’s e aprimora-os. Repetição e êxtase rapidamente entram em conflito com arbitrariedade, o absurdo com a mundanidade, enquadrando “New Long Leg” como um trabalho algo polarizador e um primeiro passo confiante em direção a algo especial.
20. Injury Reserve – By the Time I Get to Phoenix
Após a morte inesperada de Stepa J. Groggs, Parker e Ritchie voltam a juntar-se para terminar a visão do trio. Sendo um trabalho fortemente marcado pela dor da perda de um membro do grupo, “By the Time I Get to Phoenix” é um álbum devastador. Entre as vívidas descrições da agonia causada pela tragédia que os assolou, juntamente com a produção claustrofóbica de Parker, o álbum tenta esperançosamente encontrar alguma forma de manter vivo o seu espírito. Se a qualidade e inovação do álbum servem como indicador, então Groggs estaria mais do que orgulhoso.
19. LUMP – Animal
Se a primeira viagem de Laura Marling e Mike Lindsey pelas sonoridades de “indietronica” foi tolerável, então “Animal” é uma agradável surpresa deste ano, uma segunda ronda de canções sempre em constante movimento, cheia de astúcia e cuidado na produção de Mike Lindsey. A escrita de Laura Marling nunca teve, até agora, tanto “pop appeal”, mas esta sua nova faceta encaixa-lhe que nem uma luva. O potencial da dupla é finalmente atingido e espera-se que “Animal” não seja o último bom projeto entre os dois.
18. BROCKHAMPTON – ROADRUNNER: NEW LIGHT, NEW MACHINE
A enigmática “boyband” por fim supera a turbulência que, infelizmente, ofuscou grande parte dos seus lançamentos pós-“SATURATION”. O brilho dessa época evolui para algo inteiramente diferente em “ROADRUNNER: NEW LIGHT, NEW MACHINE”. Pode ser algo dececionante não ver o grupo inteiro a exibir os seus talentos ao mesmo tempo, mas isto resulta em mais versatilidade de cada um dos membros, deixando uma sensação de que estão a amadurecer diante dos olhos atentos do mundo.
17. Spellling – The Turning Wheel
Cósmico é o termo apropriado para definir “The Turning Wheel”. Cada componente das suas 12 faixas é meticulosamente trabalhado e maravilhosamente acompanhado pela voz mágica de Chrystia Cabral, transportando quem embarca nesta viagem para um conto de fadas utópico repleto de uma orquestração gloriosa e sintetizadores suaves e agradáveis. “The Turning Wheel” pode ser demasiado teatral nalgumas secções, prejudicando um pouco a imersão do mesmo, mas ainda há muito para elogiar sobre a irresistível abordagem de Cabral ao “art pop”.
16. Low – HEY WHAT
“HEY WHAT” é uma continuação direta da mudança que os Low assumiram em 2018 com “Double Negative”, reforçando desta vez as suas qualidades de abstração e experimentação num trabalho que até acaba por se aventurar pelas sonoridades de “drone” ou “ambient”. Numa carreira conjunta que já leva três décadas, Alan Sparhawk e Mimi Parker estão a incorporar uma palete de sons ousada e caótica que os eleva para uma posição pioneira e única dentro do vasto espetro da música rock.
15. Arca – KicK iii
Arca serviu um gigantesco banquete no último mês do ano com quatro novas edições da sua série “Kick” em apenas quatro dias. Os projetos variam substancialmente em estilos musicais, entre “reggaeton”, “ambient”, “hyperpop”, entre outros. No entanto, em termos de qualidade, “KicK iii” é, de longe, o mais destacável dos quatro. É o equivalente sónico a ser incendiado por 35 minutos, música “club” feroz e elétrica, produzida de uma maneira que só Arca consegue. Arca no seu estado mais progressivo e também no seu melhor.
14. St. Vincent – Daddy’s Home
Onde “MASSEDUCTION” foi algo insuficiente, “Daddy’s Home” triunfa. O sexto álbum de Annie Clark é uma versão radiante e autêntica da “psychedelia” dos anos 70, maioritariamente inspirado pela relação problemática com o seu próprio pai e com o tempo que este passou na prisão. Annie aproveita um sentimento nostálgico por rock, blues e funk para incorporar uma personagem teatral, sarcástica e destemida que conta e controla a sua própria narrativa. Um dos seus melhores trabalhos numa discografia cada vez mais deslumbrante.
13. Lingua Ignota – SINNER GET READY
Se existe um inferno na Terra, então Kristin Hayter incorpora-o na perfeição com “SINNER GET READY”. Hayter recita contos de folclore e cria uma desconstrução assombrosa e assustadora da religião com consequências diabólicas para quem se digna a pecar. Os arranjos de “folk” que marcam o álbum fazem muito para criar essa visão aterrorizante, mas são as atuações vocais demoníacas de Hayter que merecem mais destaque.
Não é algo para escutar de ânimo leve, especialmente quando o relacionamento abusivo em que se baseia é tido em conta, fazendo de “SINNER GET READY” uma experiência arrepiante.
12. Faye Webster – I Know I’m Funny haha
Embora a aparência pastel de “I Know I’m Funny haha” possa enganar alguns, o seu mais recente trabalho apresenta uma Faye Webster musicalmente mais sofisticada. Construído na base da mundanidade do dia-a-dia, Faye transforma essa simplicidade em algo fortemente texturizado e agradável para quem escuta. “I Know I’m Funny haha” é o equivalente a um cobertor e chá quente num dia de chuva ou a um raio de sol para um aumento de serotonina. A melancolia raramente soa tão reconfortante.
11. Lucy Dacus – Home Video
A composição de letras é inquestionavelmente um dos muitos pontos fortes da música de Lucy Dacus e o foco do seu terceiro álbum, “Home Video”, uma caixa de segredos do seu próprio passado elaborada, acima de tudo, com franqueza, estabelecendo uma ponte com ligação direta para o seu mundo, tal como uma cassete antiga. Cada momento de “Home Video” é reconfortante, na esperança de sarar as feridas, conectar-se com os ouvintes e alcançar alguma finalidade. Por tudo isto e muito mais, é o seu melhor álbum.
10. Squid – Bright Green Field
Num ano recheado de lançamentos notáveis de “post-rock” e “post-punk”, os Squid surgem como um dos principais vencedores. Com ênfase numa atmosfera igualmente turbulenta, dançável e viciante, a banda joga as melhores cartas do seu baralho em “Bright Green Field”, mostrando logo à partida um desejo permanente de evolução e inovação em relação aos EP’s precedentes que conquistaram muitos fãs.
Tendo também em consideração que “Bright Green Field” é apenas o primeiro álbum do grupo, o enorme respeito que os Squid merecem apenas se intensifica.
09. Sufjan Stevens & Angelo De Augustine – A Beginner’s Mind
O retorno de Sufjan ao “folk” é feito com elegância, desta vez partilhando o espaço com Angelo De Augustine, em mais um caso de conceitos inesperados no que toca à sua discografia. Ambos os artistas formam um par irresistível e a sua química vocal é mais do que o suficiente para sustentar o projeto por conta própria. Pode não ser algo tão ousado como um “Age of Adz” ou tão épico como um “Illinois”, mas “A Beginner’s Mind” compensa a sua simplicidade em consistência, refinamento e delicadeza harmónica.
Se, tal como o duo afirma, “a beleza reside onde o espírito habita”, então “A Beginner’s Mind” pode bem ser essa casa.
08. JPEGMAFIA – LP! (Offline Version)
Qualquer que seja a abordagem de JPEGMAFIA com “LP!”, acaba quase sempre por funcionar e surpreender. A sua virtuosidade não é algo de novo e, por isso mesmo, não admira que JPEGMAFIA se consiga reinventar álbum após álbum. É mais um enorme presente que o hip-hop experimental oferece ao seu público, culminando de forma caótica a sua variada lista de influências e ideias.
A natureza desarticulada do álbum pode virar-se muito raramente contra o feiticeiro, mas mesmo assim, os escassos momentos menos impressionantes de “LP!” não se assemelham a mais nada do que se pode ouvir hoje em dia.
07. Japanese Breakfast – Jubilee
Com algo tão polido e consistente como “Jubilee”, Michelle Zauner justifica completamente o seu enorme talento e potencial, bem como a sua capacidade de escrever algumas das melhores músicas de “indie pop” do momento. Sendo um álbum muito conotado pelos tons de alegria e superação pessoal, quase todas as 10 faixas de “Jubilee” podem ser consideradas destaques, mesmo que alinhem e se possam encaixar, quase sempre, no mesmo espetro musical.
É o álbum que pode dar o selo de reconhecimento massivo que Japanese Breakfast tanto merece, para além de também servir como uma forma de progresso para a própria Michelle Zauner.
06. Tyler, The Creator – CALL ME IF YOU GET LOST
Depois de mudar drasticamente a sua trajetória artística com dois dos mais celebrados álbuns de hip-hop e “neo-soul” da década passada (“Flower Boy” e “IGOR”), “CALL ME IF YOU GET LOST” consegue ainda assim surpreender, mesmo que ao início não aparente apostar tanto em narrativas ou em experimentação como o seu percursor.
Adotando a estética de uma mixtape da “Gangsta Grillz” (e com a ajuda do próprio DJ Drama), “CALL ME IF YOU GET LOST” consegue ser uma celebração digna de uma das mentes mais criativas do hip-hop, conjugando muito daquilo que já tinha implementado anteriormente. Não é a primeira vez que Tyler lança um álbum focado no “rap”, mas é, sem dúvida, o seu mais bem-conseguido e confiante trabalho nesse espetro. Acima de tudo, é mais uma vez Tyler, The Creator a fazer algo à sua imagem, sempre com muita creatividade e elegância.
05. Silk Sonic – An Evening With Silk Sonic
Enquanto Silk Sonic, Bruno Mars e Anderson .Paak recontextualizam o “soul” e o “funk” que marcaram uma parte considerável dos anos 70 e 80 para um geração de “streaming”, tentando trazer essa estética de volta em força. “An Evening With Silk Sonic” certamente não é o primeiro álbum de soul alguma vez feito, mas é um dos melhores do género nos últimos tempos. A dupla não desperdiça um único segundo do mesmo, apostando principalmente na inegável química que existe entre ambos, expondo o melhor de cada um e a grande qualidade da dupla nas 8 músicas que dão forma ao álbum.
Este álbum é, sem dúvida, marcado por uma apreciação mútua pela música “soul”, mas é o que resulta dessa admiração inicial que convém louvar.
04. black midi – Cavalcade
Para os black midi, não existem limites nem barreiras para onde o seu caminho artístico pode parar. “Cavalcade”, o segundo álbum da banda, é um bom exemplo disso. O maior feito de “Cavalcade” é o que consegue provocar nos ouvintes, sendo algo que frequentemente desorienta e confunde, com uma ideia menos inovadora e surpreendente do que a seguinte, mas que não perde coesão nem qualidade. É também uma mudança de som para os britânicos, apostando numa ambição quase epopeica e descobridora, sem deixar de recorrer a elementos de “avant-prog”, “math rock” e “jazz rock” que já estavam algo presentes em “Schlagenheim”.
“Cavalcade” só prova que ninguém realmente consegue delimitar ou até prever os black midi. O melhor é mesmo esperar o inesperado e deixar-se levar pela viagem.
03. Little Simz – Sometimes I Might Be Introvert
“Sometimes I Might Be Introvert” (ou SIMBI, de forma abreviada) é estonteante e ambicioso do início ao fim. Cada uma das canções que compõem o álbum são, por si só, razão suficiente para colocar Little Simz num lugar de topo no mundo do hip-hop, mas, quando guiadas pela narrativa que “SIMBI” tem para oferecer, ganham ainda mais força. É o melhor trabalho da rapper britânica e um dos mais consistentes, versáteis e bem conseguidos que o hip-hop teve para oferecer nos últimos anos.
Se ainda restassem dúvidas, então mais vale relembrar o que a rapper refere (e bem) a certa altura – Little Simz merece uma ovação em pé!
02. Black Country, New Road – For the First Time
Com o seu álbum de estreia, “For the First Time”, os britânicos Black Country, New Road atingem o que poucas bandas de rock atuais conseguem fazer – quebrar barreiras e desenvolver algo inovador. As comparações com Slint e Arcade Fire são frequentes, mas o que as 6 faixas do álbum provam é que estas semelhanças não passam de meras inspirações. Não há muitas bandas a soarem tão confiantes e intransigentes como os Black Country, New Road, misturando habilmente “post-rock” com “klesmer”, instrumentos tradicionais da música rock com outros mais associados à música clássica, juntando também letras algo tensas e com um forte cariz referencial.
Se são o futuro da música rock? Ninguém sabe ao certo, mas com mais álbuns ao nível de “For the First Time”, a resposta pode bem ser um assertivo “sim”.
01. Floating Points, Pharoah Sanders & the London Symphony Orchestra – Promises
Há 6 anos atrás, a lenda viva do “spiritual jazz”, Pharoah Sanders, viu algo de significante em Sam Shepard, amplamente conhecido como Floating Points. Hoje, o público tem acesso ao resultado de uma improvável proposta colaborativa entre duas mentes brilhantes nos seus respetivos espetros musicais. “Promises” permite a existência de silêncio e euforia em simultâneo, cuidando do som e do espaço em que se insere.
Através de uma junção de jazz, eletrónica e música clássica, todos os elementos que compõem “Promises” têm a sua oportunidade de brilhar e, acima de tudo, o seu devido local e propósito. Nada é desperdiçado nem nada é apressado. “Promises” é muito mais do que uma excelente coleção curatorial de sons dispersos feita por dois amantes de jazz. É uma encantadora celebração da música, merecedora de todos os minutos passados a ouvi-la.